'Não existe crime perfeito': mãe descreve pesadelo de viver sem resposta sobre chacina que matou o filho há 20 anos


Aparecida de Fátima Pires de França contou ao G1 como é seguir com a dúvida de não saber o que aconteceu com Carlos Henrique de França, uma das cinco vítimas do crime. Caso foi arquivado após mais de 12 anos de investigação. Chacina que matou 5 jovens em Teodoro Sampaio completa 20 anos O que é pior: viver com a saudade ou com a dúvida? E quando esses dois sentimentos fazem companhia um ao outro, é possível seguir? A resposta, apesar de inacreditável, é sim. E é exatamente acompanhada dessas sensações que a Aparecida de Fátima Pires de França vive há 20 anos, desde que o filho foi brutalmente assassinado e o crime não teve solução. 3 de julho de 2001. Foi exatamente neste dia que Fátima deu adeus ao filho Carlos Henrique de França, de 20 anos. O jovem foi uma das cinco vítimas da chacina em Teodoro Sampaio (SP), um crime que, depois de mais de 12 anos de investigação, acabou arquivado sem esclarecimento. A mãe, que precisou enfrentar a ausência diária do filho, disse ao G1 que também teve de aprender a lidar com a falta de resposta da Justiça. "Foi muito frustrante, porque já é muito difícil você perder um filho assassinado. O Carlos Henrique poderia ser a pior pessoa, mas ele teria que ter a chance, se fosse, a chance de ser julgado e pagar pelo crime dele, agora matar, não. Eu tive um filho adolescente, quando eu soube que eu estava grávida do meu filho, que eu era quase uma criança, eu já amava o meu filho. Então, assim, não justifica. Então, quando eles foram mortos, para a gente foi: 'Meu Deus, o que a gente está fazendo aqui na Terra?'", falou. Carlos Henrique saiu de casa no sábado, dia 30 de junho de 2001, e não voltou mais. Ele foi morto com mais outros quatro jovens. Carlos Henrique, filho de Fátima e vítima da chacina de Teodoro Sampaio Aparecida de Fátima Pires de França/Cedida "Chegou na segunda-feira eu comecei a procurar junto com o meu marido, através da Neide, que é mãe do Wilson [outra vítima da chacina], só que a Neide estava no velório do pai dela, quando ela voltou do velório que a gente foi inteirar o assunto com ela, ela até então nem sabia o que tinha acontecido. Aí nós fomos fazer as buscas, procurar em alguns lugares que eles poderiam ter ido, não encontramos. Nós fomos fazer o boletim, a pessoa que atendeu a gente nem fez muita questão. 'Mas eles não são acostumados a fazer isso?'. Meu filho não era acostumado a dormir fora de casa, ele nunca tinha dormido fora de casa. Com muito custo eles fizeram o Boletim de Ocorrência", relembrou Fátima ao G1. No dia 3 de julho de 2001, a família foi notificada pelo Conselho Tutelar de que os jovens tinham sido encontrados e de que a situação era "bem séria". "Nós fomos até o local. Chegando lá, já estava tudo com um monte de corda, um monte de polícia e tudo, não queriam permitir a entrada da gente, sendo que já tinham entrado 'trocentas' pessoas lá, aliás, eu acho que a cena do crime foi totalmente mudada, já começou aí, totalmente errado. Eu não entendo nada dessa parte, mas eu acredito que isso aí atrapalhou bastante", desabafou a mãe. No local do crime, Fátima contou ao G1 que ela e o esposo, pai de Carlos Henrique, encontraram o filho morto. Fátima e o filho Carlos Henrique na infância Aparecida de Fátima Pires de França/Cedida "Meu marido voltou, eu vi de longe assim, ele andava, eles [as vítimas] estavam cobertos com jornais, ele andava, ia reconhecer uma pessoa, andava e ia reconhecer outra, aí ele voltou. Mas ele voltou assim, sabe, ele tremia muito, aí ele falou: 'Vamos embora'. Aí eu perguntei se o Carlos Henrique estava lá e ele falou: 'Olha, Fátima, é algo que eu nunca queria te falar, mas ele está, da pior forma que você pode imaginar'. Foi o começo da tortura na vida de gente", disse. A notícia da morte deixou Fátima "fora de órbita". Ela não sabia de possíveis inimizades que o filho poderia ter e não conseguia entender como o crime havia acontecido. A dúvida existe até hoje na vida da família. "Quando ele foi assassinado, começou a investigação, um pessoal veio de São Paulo [SP], de [Presidente] Venceslau [SP], e não chegou a conclusão nenhuma. Uma cidade com pouco mais de 20 mil habitantes, cinco famílias envolvidas nessa chacina, não existe crime perfeito, ainda mais em Teodoro Sampaio, então, realmente é uma situação muito frustrante. O que você quer, depois que perde um familiar, é justiça, é pelo menos você ver o infeliz dentro cumprindo, que não vai pagar, mas vai cumprir pelo menos", lamentou a mãe ao G1. Apesar da constante dor da saudade, Fátima falou ao G1 que foi ativa durante os mais de 12 anos de investigação antes do arquivamento do caso, mas nem ela nem todas as outras famílias envolvidas, tiveram uma resposta. Carlos Henrique com a irmã na infância Aparecida de Fátima Pires de França/Cedida "A gente tentou, a gente levava pista, a gente ficava sabendo. Nós viramos investigadores, eu e o meu marido. Porque não existe um negócio desse, você saber que mataram um filho teu e não chega a uma conclusão, pelo amor de Deus, não tem como. Então, a gente investigava bastante, procurava tentativas, mas infelizmente não tivemos êxito", acrescentou. Mas o que sobra diante de uma tragédia como essa? A falta, a ausência, a saudade. Sobram as lembranças, os bons momentos que não voltam e uma dor que não se compara, uma ferida que o tempo não cicatriza. Ficam as dúvidas, as incertezas, um crime sem solução. "Não tem como você esquecer do seu filho, principalmente com uma morte dessa, então, a gente vive com essa saudade, com essa tristeza, com esse pedaço faltando em você. É bem difícil. A gente espera, no nosso Deus, que acima de tudo e de todos, que Ele traga isso pra gente, eu tenho que confiar, eu tenho que acreditar, porque na Justiça infelizmente eu não tive êxito, mas eu acredito em Deus. Eu peço para Ele todos os dias para que eu não venha a morrer sem saber o que aconteceu e eu acredito que Ele vai me mostrar", pontuou Fátima ao G1. Carlos Henrique com os pais no aniversário de 4 anos Aparecida de Fátima Pires de França/Cedida VÍDEOS: Tudo sobre a região de Presidente Prudente Veja mais notícias em G1 Presidente Prudente e Região.

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